Greve dos Enfermeiros foi braço de ferro contra o novo ACT e o temor do ‘Retrocesso Social’
A saúde pública em Portugal enfrenta um novo e significativo período de turbulência, com a greve dos enfermeiros a paralisar centenas de serviços em todo o país.
O protesto, impulsionado pelo desacordo com o novo Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) proposto pelo Ministério da Saúde, reflete um profundo descontentamento profissional, centrado naquilo que os enfermeiros classificam como um «retrocesso social e laboral inadmissível» e no lema «Trabalhar mais e receber menos».
O cerne do conflito reside no ACT, que, segundo as estruturas sindicais, ameaça direitos adquiridos e precariza as condições de trabalho. Os enfermeiros têm sido claros nas suas críticas, sublinhando que as propostas governamentais não só falham em valorizar a classe, como impõem regras que dificultam a sua progressão e aumentam drasticamente a carga horária.
As principais críticas ao ACT apontam para diversos recuos. Entre os mais contestados está o impedimento da progressão na carreira, essencial para a motivação e reconhecimento profissional. Adicionalmente, o Ministério da Saúde propõe a «retirada do tempo de passagem de turno como tempo efetivo de trabalho, ignorando o tempo necessário para a continuidade e segurança dos cuidados prestados aos utentes».
«A extinção da jornada contínua como regime regra, abrindo caminho a modelos menos favoráveis aos profissionais e a imposição de regimes de Banco de Horas, Adaptabilidade e Horário Concentrado, que podem prolongar o horário diário e semanal até às 60 horas, sem que estas horas adicionais sejam contabilizadas como trabalho extraordinário».
«O fim do pagamento das chamadas horas penosas, do trabalho extraordinário e do pagamento pelo regime de prevenção, resultando numa diminuição real da remuneração».
Os enfermeiros alertam ainda para o risco de precarização das condições de trabalho e a facilitação da entrega da gestão pública das Unidades Locais de Saúde (ULS) às Parcerias Público-Privadas (PPP), um cenário que tem gerado receio entre os profissionais do Serviço Nacional de Saúde (SNS).
Perante estas críticas, o Ministério da Saúde defende o novo ACT como uma medida de «modernização da gestão» das ULS e de aumento da eficiência. A tutela argumenta que as novas regras visam dotar os serviços de maior flexibilidade na organização do trabalho, permitindo uma melhor adaptação às exigências do sistema de saúde e um controlo mais apertado dos custos operacionais do SNS.
No entanto, a posição do Ministério é contestada pela falta de ações concretas. Até ao momento, não foram apresentadas medidas efetivas para a valorização profissional, nem foram abertos concursos para novas contratações ou para o acesso a categorias superiores. Este vazio agrava o problema da carência generalizada de enfermeiros, que continua a ser um fator de stress e sobrecarga para os profissionais existentes.
A greve tem tido um impacto notório, afetando centenas de serviços em hospitais e centros de saúde, especialmente consultas externas, cirurgia programada e algumas atividades nos centros de saúde. Embora os serviços mínimos tenham sido assegurados, a contestação demonstra a seriedade do descontentamento, simbolizada pela entrega de uma moção com mais de 11.000 assinaturas junto ao Ministério da Saúde. Os enfermeiros exigem uma negociação justa, melhores condições de trabalho e responsabilizam o Governo pela atual precarização da carreira.